Agência oficial do evento
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Simpósios Temáticos |
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Título: História & Música Popular |
Proponentes: Adalberto Paranhos (Universidade Federal de Uberlândia), Tânia da Costa Garcia (Universidade Estadual Paulista - Franca) |
Descrição: Já há algum tempo, como que tateando novos caminhos, os historiadores têm procurado incorporar ao arsenal de recursos de pesquisa outras linguagens, para além das habituais. Esse ato, próprio de quem se lança ao desafio de experimentar novos sabores dos saberes, resultou numa bibliografia, de produção mais ou menos recente, que valoriza objetos de estudo normalmente postos à margem pela academia.
Nessas circunstâncias, a música industrializada vem assumindo crescente importância como fonte documental, respondendo por uma parcela dos esforços daqueles que se empenham em insuflar novos ares nas pesquisas históricas.
Independentemente da tendência – bastante evidente no caso de historiadores, cientistas sociais e profissionais da área de literatura – de se concentrar o foco de análise quase exclusivamente, ou pelo menos de forma prioritária, nas letras das canções, a complexidade do trabalho com música conduziu muitos pesquisadores a trilhar caminhos paralelos. Sem que se colocasse no primeiro plano o estudo de natureza especificamente musicológica, passou-se, mais e mais, a atentar para as relações de complementaridade e/ou de oposição que as letras entretêm com outros elementos da obra musical na sua realização histórica ou no seu fazer-se.
Logo se percebeu que a decifração da linguagem estritamente musical, conectada à eventual filiação a “gêneros musicais”, à família instrumental que intervém na geração de uma certa sonoridade ou formatação timbrística, nada disso é estranho aos que se disponham a percorrer todo o arco de opções de quem elege a música como um dos objetos de estudos históricos. Afinal, a música fala sem recorrer necessariamente a palavras impressas e cantadas.
Além do mais, difundiu-se a consciência de que as palavras que, aparentemente, injetam sentido numa canção não deixam de se submeter, numas tantas situações, a um processo de dessignificação e/ou de ressignificação, ou, como queira, de reapropriação. Dito de outra maneira, evidenciou-se que o sentido das letras das canções é cambiante, muda, por vezes, com o tempo, na dependência do contexto histórico-musical em que ressurgem. Enfim, quando não permanecemos reféns da mera literalidade das letras, estamos aptos a compreender que nenhum significante se acha irremediavelmente preso a um significado único, esvaziado de historicidade.
A partir daí, os pesquisadores começaram a pisar mais firmemente o terreno da polissemia. Com base na constatação de que, nem de longe, uma canção retém um sentido unívoco, congelado no tempo e no espaço, muitos se deram conta de que, dialeticamente, a produção de sentidos abriga múltiplas leituras possíveis, por mais ambíguas e contraditórias que sejam. Por vezes observou-se que, aqui e ali, se cava tamanha distância entre autor e obra, quando esta circula socialmente, que a criatura pode chegar a exprimir ampla autonomia em relação ao seu criador, a ponto de significar o não-pensado.
Em meio aos avanços vivenciados na pesquisa histórica com música popular, outra conclusão, não menos relevante, apontou para a necessidade de atribuir o devido peso analítico à performance. Ganhou força a idéia de que interpretar implica também compor. Por outras palavras, quando alguém canta e/ou apresenta uma música, sob essa ou aquela roupagem instrumental, atua, num determinado sentido, não como simples intérprete, mas igualmente como compositor. O agente, no caso, opera, em maior ou menor medida, na perspectiva de decompor e/ou recompor uma composição, o que ocorre de modo consciente ou inconsciente.
Este quadro, aqui desenhado em rápidas pinceladas, nos fornece um breve painel das potencialidades e da riqueza do trabalho do historiador preocupado com a tarefa de deslindar as relações que delineiam conexões possíveis entre música popular e o contexto histórico sociopolítico mais geral. Envolve ainda, por certo, reflexões de caráter fundamentalmente metodológico a respeito dos usos que se podem fazer da canção popular para a análise crítica da realidade histórica.
Por tudo isso, o simpósio que propomos, ao privilegiar o binômio História & Música Popular, se abre como um imenso campo destinado a acolher contribuições as mais diversas que nos permitam enriquecer o repertório de procedimentos do historiador. Numa época marcada pela transdisciplinaridade, foi-se o tempo de uma História enclausurada em si mesma, às voltas apenas com seus objetos tradicionais. A História Cultural está aí para nos dar razão. Com a desmontagem de muitos dos andaimes nos quais se apoiou a História, a cada dia se perde a nitidez dos contornos fixos. A oxigenação e o arejamento do ofício do historiador passa pela busca de novas linguagens, no seu entrecruzamento com a História. E é aí que o estudo da música popular, aliado à investigação dos processos históricos, pede licença para dizer a que vem. |
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